
. Quase esqueci o pé que baloiçava nu, corredor adiante, fora do lençol. Quase esqueci as coisas que se pegam à gente e não nos largam, insistem, perduram, sem que compreendamos o motivo: pedaços de canções, frases escutadas na rádio, o meu pai a jogar ténis na Urgeiriça, de calças compridas brancas e pulôver branco, eu a andar de bicicleta, como um burro de nora, em torno do castanheiro, unicamente capaz de zeros numa aflição de queda. As árvores lá em baixo, mas demasiado longe para poder tocá-las: bem tentei. O castanheiro secou e cortaram-no. Ficou um buraco no seu lugar. O mesmo em que às vezes, em momentos muito secretos, me apetece enfiar-me. E escutar, debaixo da terra, a bomba de puxar água do poço, que um dia destes, não sei quando, não me puxará mais. António Lobo Antunes . Para a menina Alice .